23 abril, 2010

Cadê meus paradigmas?

Flávio Takemoto

O homem perde o chão e paredes onde se escorar, na medida em que seus territórios físico, emocional, intelectual, religioso, político se tornam imensamente grandes devido a imersão num modo de vida pós-moderno, pós-industrializado, multiglobalizado. É como se todas essas esferas fossem o sustentáculo da frágil existência do ser e de sua identidade, para consigo mesmo, para com o próximo e para com o coletivo, como chão e paredes em que nós estivemos apoiados por milênios e agora, de súbito, todas elas se afastam.

O homem com sua consciência ainda delicada e sua formação psíquica débil, não totalmente formada, não tem mais parâmetros no qual se sustentar, se equilibrar, as paredes invisíveis que o deixavam de pé e o chão que lhe promovia a sustentação, estão desvanecendo de acordo com o ritmo da multiglobalização.

O espírito coletivo começa a desaparecer com a individualização exacerbada do “eu”. Aquela conectividade e senso de coletividade, que manteve por milênios os homens reunidos, não somente fisicamente, mas sim espiritualmente e socialmente perde a função, dando lugar a meras necessidades de consumo, principalmente o consumo cultural.

Consumo cultural hedonista esse que está diferenciando pessoas e classes que podem ter acesso a shows, televisão paga, cinema, filmes, teatros, que horas são caros, ora são exclusivos, daqueles que não tem acesso, criando assim mais um tipo de desigualdade: a desigualdade cultural (no sentido do consumo desses produtos culturais).

Procuramos por essa liberdade, de nos livrarmos das paredes sufocantes e que tolhiam nossa criatividade, o nosso espírito inventivo, a nossa independência. Quando começamos a perceber libertos, começamos a nos debaldar diante mil possibilidades, a devorar sem vergonha ou limite tudo aquilo que a pós-modernidade multiglobalizada nos proporcionou. A facilidade tem um preço, o excesso tem um preço. Como organismo coletivo estamos em crise, passando mal agora. Não é hora de teorias apocalípticas de fins da sociedade, mas sim de tomar a consciência de que como um organismo vivo, a exacerbação pode gerar um câncer.

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